Resenha: Ys VIII - Lacrimosa of Dana

Faz um bom tempo que não escrevo uma resenha de algum jogo por aqui. Isso se deve aos dois últimos meses bem intensos com a rotina de trabalho, além de eu estar jogando outros dois jogos em paralelo. Por isso, jogos que me costumam tomar um mês para concluí-los acabaram tomando o dobro desse tempo. Mas isso não quer dizer que a jornada tenha sido ruim — muito pelo contrário. Assim, trago a resenha da minha mais recente conclusão.

Como já falei sobre a franquia Ys em uma resenha anterior, não vou enrolar nas introduções. Ys VIII — Lacrimosa of Dana é mais uma aventura do nosso queridíssimo aventureiro ruivo Adol Christin. A bordo do navio Lombardia e acompanhado do seu fiel amigo Dogi, eles estão em uma viagem rumo a cidade de Altago enquanto fazem um bico como ajudantes da tripulação para custear a viagem. Em uma bela noite, eles são atacados por um monstro marinho e, mesmo tentando combatê-lo, ele acaba destruindo o navio e seus passageiros e tripulação naufragam na misteriosa Ilha de Seiren.

Como já é de lei na franquia, Adol acorda no meio da praia após o navio no qual estava a bordo ser atacado, e é aqui onde nossa história realmente começa.


Irei me adiantar: Ys VIII — Lacrimosa of Dana é um jogaço. Talvez, o melhor jogo da franquia e um dos melhores action-rpgs já produzidos. Primeiramente, a nova engine proporciona um baita salto de qualidade gráfica. Dando um pouquinho de contexto histórico e pessoal, Ys era uma franquia que tinha se isolado no oriente até a XSEED e a NIS America localizarem seus jogos na década passada. Enquanto os japoneses tiveram seus lançamentos na “época correta”, muitos jogos chegaram aqui com uma certa defasagem gráfica e ports que no máximo escalonavam as texturas, que eram originalmente em 480/720p.

Por mais que eu ame franquia, não vou negar que jogar com personagens, cutscenes e interfaces esticadas causavam um certo desconforto. Algumas vezes, era até melhor jogar em modo janela do que em tela cheia. Mas esse incômodo finalmente acabou em Ys VIII, pois as texturas estavam em Full HD e os modelos mais polidos, tornando-o um jogo bonito de se ver e se jogar.

Por outro lado, tem uma coisa em Ys que nunca decepciona: a sua trilha sonora. Aqui, temos mais um trabalho primoroso da Falcom Sound Team, digno de ouvir em repetição durante a academia ou fazendo tarefas domésticas. Sunshine Coastline é a música do primeiro mapa da aventura e já chega com os dois pés no TOP 10 de melhores músicas de jRPG.

Uma música de “primeiro mapa” não precisava ser tão épica, mas ela é.

O conteúdo do jogo também teve um acréscimo considerável, pelo menos no meu ponto de vista. Enquanto precisei de 15–30 horas para zerar os jogos anteriores, Ys VIII levou mais de 50. Definitivamente, colocou a franquia em outro patamar.

E, falando em conteúdo, não posso esquecer da história. Ela pode ser resumida em dois grandes objetivos. O primeiro é claro: resgatar todos os passageiros do Lombardia que estão perdidos na ilha. Logo no começo, você funda uma pequena aldeia para tentar sobreviver em um ambiente hostil repleto de monstros. Mas não pense que os passageiros serão meros NPCs que ficarão empilhados na aldeia. Nessa busca, você encontrará artesãos, médicos, cozinheiros, mercadores e até burgueses safados. Cada um deles desenvolverá uma função na aldeia que te auxiliarão no seu jogo, como fornecer itens de cura, alimentos, armamentos, etc. Resgate todos!

O segundo objetivo, este mais enigmático, envolve o protagonista Adol. Desde que naufragou na ilha, ele vem tendo frequentes sonhos com uma misteriosa moça de cabelos azuis e uma civilização que aparentemente habitava essa região. Inevitavelmente, os dois objetivos acabam se cruzando e Adol e cia precisarão desvendar os mistérios da Ilha de Seiren antes que seus perigos os devorem primeiro.

Apesar do cliché da sobrevivência em uma ilha deserta, a história ainda foge um pouco dos padrões Ys a respeito de exploração e worldbuilding. Ao contrário de outros jogos, onde você encontra vilarejos e cidades já pré-estabelecidos, Adol agora está em um ambiente inóspito e sua única pista de civilização são os passageiros naufragados e os sonhos de acontecimentos que parecem ser de outra era.

Outro ponto que me chamou a atenção foram algumas decisões ousadas do enredo. Você terá momentos de alegria e de tristeza — nem todos os passageiros resgatados são boas pessoas, e nem todos retornarão vivos para o continente... Mesmo sendo NPCs, eles parecem ter sido escritos com carinho e a última coisa que você sentirá por eles será indiferença.

E foram esses pontos que tornaram Ys VIII tão marcante. Mesmo inabitada, quanto mais você explora a Ilha de Seiren, mais ela te desperta a curiosidade sobre seu passado, presente e futuro. O que começa com uma história de naufrágio e sobrevivência se torna um mistão de Jurassic Park, Indiana Jones, Monster Hunter e E.V.O. Search for Eden — e um da melhor qualidade!

Ainda temos o melhor de Ys: sair correndo matando monstros ao som de música boa.

Quanto a jogabilidade, ela mantém os padrões estabelecidos em seus lançamentos anteriores: você controla um trio de personagens que possuem armas de diferentes categorias — corte, perfuração e contusão — cada uma tendo vantagens e desvantagens contra monstros específicos. Conforme explora a Ilha de Seiren, você adquire novos minérios para refinar e aprimorar seus equipamentos. Por fim, você pode se aproveitar de esquivas e bloqueios no tempo certo para desferir golpes mais rápidos e/ou com acerto crítico.

Se eu pudesse dar um único ponto fraco ao jogo, seria o modo “Raid” dele, onde você precisa defender a sua vila de sobreviventes de hordas e hordas de monstros. Embora ele esteja ali para fugir um pouco dos padrões de action-rpg que estamos habituados, muita das vezes, as raids eram obrigatórias e aconteciam justamente em momentos no qual o enredo estava em um ponto alto de revelações. Por isso, em quase todas as ocasiões, eu fazia as raids por mera obrigação pois só queria que acabassem logo e a história avançasse...


Não sei o quanto fica claro no trailer ou no título, mas Dana é a moça de cabelos azuis que aparece ao lado de Adol. A partir do terceiro capítulo do jogo, os sonhos de Adol deixam de ser apenas sonhos e Dana passa a ser uma personagem jogável. Posteriormente, o caminho dos dois se cruza e ela passa a integrar o grupo principal.

Dana é uma personagem muito bem escrita. Fugindo dos estereótipos de sacerdotizas “lawful good”, ela é uma personagem carismática, corajosa e independente. Seu arco acrescenta muito mais profundidade a história, principalmente na segunda metade, quando resgatar os passageiros naufragados passa a não ser a única prioridade do elenco. Não a toa, ela é a protagonista feminina mais popular da franquia e a mais shippada pelos fãs. Uma pena (?) que nosso herói seja “100% fiel” a Feena, a semi-deusa que ele encontrou nas suas primeiras aventuras e nunca mais avistou.


Repetindo para concluir, Ys VIII — Lacrimosa of Dana é um marco na franquia. Nova engine, história fora da curva e com um baita plot-twist, personagens jogáveis e não-jogáveis bem-escritos, e trilha sonora com o selo de alta qualidade dos padrões da Nihon Falcom.

Na minha resenha sobre Ys — Memories of Celceta, antecessor em ordem de lançamento, eu havia sugerido começar por ele para termos uma pequena noção de como Adol Christin começou suas aventuras. Porém, Ys VIII é um jogo tão bom que acaba sendo uma recomendação certeira para quem quer se interessar na franquia. Mas, por outro lado, recomendar começar por Ys VIII colocaria o sarrafo tão lá no alto que poderia desanimar os jogadores ao seguirem para outros jogos da franquia. Enfim, uma escolha “difícil” — aspas porque são excelentes jogos. Siga seu coração pois você sairá satisfeito em ambos.

Ys VIII — Lacrimosa of Dana está disponível para PC, Nintendo Switch, Playstation 4, Playstation 5, Playstation Vita, Android e iOS.

Até a próxima! o/


Considerações Finais

Uma pequena curiosidade sobre a cronologia dos acontecimentos: No começo do jogo, Adol e Dogi mencionam estarem partindo da região de Xandria — onde se passou os eventos de Ys V — e estão a caminho da cidade de Altago — onde se passarão os eventos de Ys SEVEN — mas imprevistos acontecem e eles vão parar na Ilha de Seiren — onde se passam os eventos de Ys VIII. Logo, a ordem cronológica desses jogos é “5–8–7”.

Se acostume com isso. A ordem de lançamento dos jogos nada tem a ver com a ordem cronológica dos eventos. Como fã da franquia, a melhor dica que eu posso dar para novos jogadores é: “não ligue para a cronologia” 😛. Meu palpite é que isso seja proposital. Em termos de lore, o narrador, que introduz a história ao início de cada jogo, lê os diários de um aventureiro Adol já aposentado em uma ordem “aleatória”, seja lá como ele organizou...

Enquanto a série Trails, outra obra-prima da Nihon Falcom, segue um roteiro linear conforme novos lançamentos, Ys faz o completo oposto, dando peças aleatórias de um quebra-cabeça para que sejam encaixadas aos poucos a cada novo diário apresentado aos jogadores. Nem todo mundo aprecia essa dinâmica, mas há uma fanbase fiel aí que mergulhou na brincadeira de cabeça.